terça-feira, 8 de dezembro de 2015

Caves São João

Entrar nas Caves São João é entrar na história do vinho da Bairrada e de Portugal, é parar no tempo, ou pelo menos, entrar numa dimensão onde o tempo anda mais devagar...


"Fundadas em 1920", regista o painel que está na entrada das caves antigas, onde repousam os espumantes da casa. Trata-se de quase um século de história, de uma casa com vinhos da região da Bairrada e do Dão, adquirindo uva e vinho a produtores seleccionados ao longo da sua actividade, que dão origem aos lotes dos vinhos Frei João (Bairrada) e Porta dos Cavaleiros (Dão). Acrescem as marcas Caves São João e Quinta do Poço do Lobo, sendo esta última utilizada apenas nos vinhos com origem na quinta com o mesmo nome, propriedade da casa na região da Bairrada.


A porta está aberta ao público, sendo possível a qualquer visitante entrar, nem que seja apenas para adquirir vinhos. Podemos provar qualquer vinho, dos actuais e dos antigos, sendo possível também efectuar visita.

Este espaço de loja possibilita também a realização de provas e de pequenos eventos particulares ou corporativos, e é onde se inicia a visita, com acesso as caves (novas).

As Caves São João possuem um património de quase um milhão de garrafas, entre 0.75l e 1.5l (magnum), de várias colheitas desde 1959, das marcas Frei João, Porta dos Cavaleiros, Caves São João Reserva Particular e Quinta do Poço do Lobo.

É impressionante atravessar estas salas onde repousam e envelhecem lentamente todos estes vinhos, cuidadosamente empilhados por anos e marcas. Há também um considerável parque de barricas, onde estagiam alguns vinhos e onde envelhece a aguardente.

As garrafas estão naturalmente por rotular, pois a humidade envelhece e degrada rapidamente os rótulos. Desta forma, cada garrafa vendida é rotulada na hora, após ser examinada e aprovado o seu estado de conservação.


Do outro lado da estrada situam-se as caves antigas, onde repousam os espumantes. São milhares de garrafas colocadas nos pupitres (cavaletes), para que o espumante envelheça e adquira o seu carácter. 

Um ambiente húmido, aliás, existe uma pequena fonte de água dentro da cave. A temperatura constante, a humidade, a ausência de luz directa garantem as condições de envelhecimento, sendo que as teias de aranha ajudam e dão um toque especial.

A prova estava marcada, e o tema também estava definido: vinhos "velhos".  Eu prefiro o termo "vinhos evoluídos", pois velhos serão quando estes se encontram numa fase descendente da sua evolução ou até mesmo decadentes.

Foram provados os seguintes vinhos:

- Porta dos Cavaleiros branco 1964 Colheita
Cor dourada com tom âmbar, límpido e brilhante. Aroma evoluído, resinas, toffee, melado, num conjunto complexo, elegante e agradável. Elegante e com uma frescura impressionante para um vinho com mais de 50 anos, é seco, amplo e bem persistente, num final com frescura, fruto seco e um toque ligeiramente salgado. Grande vinho, elegante com um toque de untuosidade e boa frescura. 


- Frei João branco 1966
Cor dourada, com alguma intensidade, límpído e brilhante. Aroma terroso (terra húmida) e alguma resina. Seco, muita frescura (relembro que este vinho tem quase 50 anos!), alguma rusticidade na sua textura, é um Bairrada com boa boca e boa persistência, com alguma salinidade, num registo de pouca fruta fresca, mas que ainda não ganhou o perfil de fruto seco. Ainda em evolução, talvez seja melhor decantar.
 
- Frei João branco 1974
Amarelo-palha, com tom dourado, límpido e brilhante, é um branco fechado de aromas, com sugestões de resina e de mel. Muito fresco, ainda tenso, seco, cremoso, é um branco amplo e com boa persistência, com final fresco, seco e algum fruto seco tostado. Um vinho que ainda irá crescer.

- Porta dos Cavaleiros branco 1979
Amarelo-palha,  com tom esverdeado, límpido e brilhante, aroma fechado, notas de fósforo, resinas e sugestão vegetal. Encorpado, muito fresco e seco, com bom comprimento e persistência, com algum fruto seco no final.

- Porta dos Cavaleiros branco 1984 Reserva Seleccionada
Dourado brilhante, pouco aromático, com sugestão de fruta branca cozida (perâ). Muito seco, fresco, mineral, cremoso e alguma textura. Ainda com fruta presente, começa a sentir-se alguma evolução. Um "jovem" com mais de 30 anos, muito equilibrado, fresco e que ainda irá continuar a crescer. Bom vinho.

- Frei João branco 1988
Amarelo-palha, com ligeiro tom dourado, é fechado de aroma, com sugestão de fósforo. Encorpado, cremoso, muita frescura, é um branco seco, com boa boca e boa persistência, com final fresco e com algum fruto seco.

- Frei João branco 1990
Leve cor dourada, brilhante. Aromático, sugestão de resina e fruta branca muito discreta. Um perfil menos fresco que o habitual, ligeiramente untuoso e seco, amplo e boa persistência, com alguma fruta branca, um toque de fruto seco e mentolado. Um perfil diferente, elegante e distinto. Grande vinho.

- Porta dos Cavaleiros tinto 1966 Reserva (magnum)
 Cor ruby aberta, com tom acastanhado. Aromático, cheio de aromas terciários, algum vinagre inicial que desapareceu e evoluiu. Amplo, boa persistência, fresco e com algum tanino ainda presente, é seco, corpo médio, com alguma fruta silvestre e notas terrosas.


- Frei João tinto 1966 Reserva (magnum)
Cor ruby com alguma intensidade, com ligeiro tom acastanhado. Aroma muito fechado, notas químicas, fruta preta. Muito fresco, elegante, amplo e boa persistência, é um tinto seco, ainda com alguma fruta presente, fresco, com ligeiro mentolado e mineral. Grande vinho da Bairrada.

- Porta dos Cavaleiros tinto 1974 Reserva 
Cor ruby, com alguma intensidade, brilhante e com ligeiro tom acastanhado. Aromático, fruta madura, algum balsâmico e sugestão mentolada, num conjunto elegante e agradável. Encorpado, fresco, fruta madura discreta mas presente, é um tinto amplo e muito persistente, com final seco, ligeiramente frutado, um toque balsâmico e mineral. Um grande vinho do Dão, um "jovem" com mais de 40 anos!

- Frei João tinto 1980 Reserva
Ruby profundo, brilhante com ligeira tonalidade castanha. Aromático, fruta madura, notas balsâmicas, um conjunto concentrado, profundo e agradável. Encorpado, concentrado, intenso, muito fresco e com fruta presente, é um tinto seco, amplo e com boa persistência. Um grande vinho da Bairrada, com apenas 35 anos de idade!

- Porta dos Cavaleiros tinto 1985 Reserva 
Cor ruby com alguma intensidade. Aromático, fruta madura, é um tinto encorpado, fresco e mineral, com concentração e elegância. Muito seco, tanino presentes mas muito fino e polido, é amplo e muito persistente, com final fresco, com alguma fruta e notas balsâmicas. Um grande ano, um belíssimo vinho do Dão, que celebrou 30 anos.

- Frei João tinto 1990
O último vinho em prova, o único da década de 90, com apenas 25 anos de idade. Um vinho que apresenta uma cor jovem, sem sinais de envelhecimento, tal como no aroma, dominado pela fruta madura e sem predominância de aromas de evolução. Ainda um pouco rústico, é um vinho ainda muito jovem, cheio de frescura, seco e tenso. Precisa de tempo, de muito tempo para crescer e evoluir...



Uma visita ímpar, altamente recomendável a todos os amantes de vinho (dos evoluídos mas também dos novos, bem como de espumantes). Até sempre, e espero que em breve...

Avinhado a 20 de Novembro de 2015.

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